existencialistas autistas?

Vou lançar a hipótese para vocês pesquisarem:

Alguns (a maioria?) filósofos existencialistas eram autistas e o existencialismo é uma filosofia que apresenta a experiência neurodivergente como um universal humano. Por isso tanta gente acha tão estranha.

  • A “náusea” de Sartre, a incômoda sensação de existir, pode ser vista como um episódio de dissociação ou despersonalização.
  • O caráter negativo do olhar do outro no existencialismo é algo que os neurotípicos não conseguem entender, porque para eles a atenção alheia é boa, e eles se submetem a todo tipo de humilhação para o conseguir, enquanto os neurodivergentes temem e evitam os espaços em que serão vistos.
  • A ideia do gênero como algo construído artificialmente na história social e na individual que Beauvoir defende é uma consequência lógica da dificuldade dos neurodivergentes de se encaixar naturalmente nos papéis sociais que se propõe para eles. Mas é também algo que soa alienígena para neurotípicos que tratam essas categorias como premissas naturais a partir das quais o resto do pensamento se desenvolve.
  • A sensação de ser um estrangeiro, de não pertencer ao mundo em que vive, que Camus chama de absurdo, é a condição normal das pessoas neurodivergentes que tem dificuldade em estabelecer laços sociais e de pertencimento e que não conseguem compreender facilmente os motivos por trás das ações dos outros.
  • A rejeição de uma essência humana, de algo permanente e imutável no indivíduo, que seria definido apenas por sua história e suas ações, literalmente, é um marcador do transtorno do espectro autista, chamado de alexipersona.
  • Uma consequência lógica é a ideia de que seria possível planejar racionalmente a vida e as ações, construir um projeto de vida e a si mesmo, agir sobre si mesmo a ponto de quase se tornar outra pessoa, que beira o absurdo de uma utopia racionalista para neurotípicos. Porém, é o que toda pessoa neurodivergente precisa fazer para ser capaz de viver em uma sociedade que impõe padrões de normalidade absurdos, baseados na tradição em vez de na racionalidade, e que hoje em dia tem o nome de “masking” em sua expressão mais extrema.
  • A necessidade de viver com Autenticidade, seguindo as próprias regras e valores para ter uma vida plena, capaz de escapar da angústia existencial, é a décima quinta ou décima sexta coisa na lista de prioridades dos neurotípicos, que valorizam mais o pertencimento ao grupo e o reconhecimento pelo outro. Mas é algo tão importante para neurodivergentes que, literalmente, é um marcador do transtorno do espectro autista.

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2 Comentários

  1. Não manjo de existencialismo, mas o texto me pareceu partir de premissas biomédicas da neurodivergência e neurotipicidade humana que são, para várias estudiosos, já superadas ou, se preferir um modelo bem simplista que não explica bem a complexidade da realidade humana.

    A narrativa de que neurotípicos são/agem assim e neurodivergentes são/agem assado, felizmente, não sobrevive à realidade quando se pega amostras grandes e diversas de pessoas e culturas.

    E por último, mas não menos importante, neurodivergência é uma categoria diagnóstica histórica, médica e psicologicamente muito recente… uma perspectiva de medicalização da vida que não faz sentido aplicá-la de modo afirmativo a personalidades que não estão mais entre nós.

    A natureza humana é simplesmente diversa!

  2. Me parece uma hipótese bem provável mesmo (e passível de pesquisa).

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