2015 provavelmente foi o ano em que fui mais ativo no Facebook, e tenho que dizer que foi uma experiência antes de mais nada insatisfatória. De certo modo, o Facebook se tornou aquela festa barulhenta em que eu não consigo ficar porque ou todo mundo está bêbado, ou a música está alta demais para conversar.
Em resumo, percebi que o Facebook me cansa e desgasta mais do que me entretém e diverte.
Há uma série de pequenos jogos em curso lá. É a máquina de gamificação perfeita. Caí em alguns, me livrei de outros, mas o que marcou o ano foi que venci um dos principais: ficar popular. Fiz posts compartilhados ad nauseum e ultrapassei a marca dos mil amigos. Ganhei dezenas de notificações por dia. E a cada dia ele se tornava um lugar mais insuportável. Menos relevante, menos divertido, menos inteligente, menos merecedor de um pingo de atenção e mais sedento de atenção.
A impressão aterradora que tenho é que não há melhor exemplo das maiorias silenciosas de Baudrillard que o Facebook, um aglomerado onde nada significa, por mais que se expresse, porque é tudo signo e nada significado.
“Seja qual for seu conteúdo, [da informação] político, pedagógico, cultural, seu propósito sempre é filtrar um sentido, manter as massas sob o sentido. Imperativo de produção de sentido que se traduz pelo imperativo incessantemente renovado de moralização da informação: melhor informar, melhor socializar, elevar o nível cultural das massas, etc. Bobagens: as massas resistem escandalosamente a esse imperativo da comunicação racional. O que se lhes dá é sentido e elas querem espetáculo. Nenhuma força pôde convertê-las à seriedade dos conteúdos, nem mesmo à seriedade do código. O que se lhes dá são mensagens, elas querem apenas signos, elas idolatram o jogo de signos e de estereótipos, idolatram todos os conteúdos desde que eles se transformem numa sequência espetacular. O que elas rejeitam é a “dialética” do sentido. E de nada adianta alegar que elas são mistificadas. Hipótese sempre hipócrita que permite salvaguardar o conforto intelectual dos produtores de sentido: as massas aspirariam espontaneamente às luzes naturais da razão. Isso para conjurar o inverso, ou seja, que é em plena “liberdade” que as massas opõem ao ultimato do sentido a sua recusa e sua vontade de espetáculo. Temem essa transparência e essa vontade política como temem a morte. Elas “farejam” o terror simplificador que está atrás da hegemonia ideal do sentido e reagem à sua maneira, reduzindo todos os discursos articulados a uma única dimensão irracional e sem fundamento, onde os signos perdem seu sentido e se consomem na fascinação: o espetacular.” – Jean Baudrillard
Não é apenas um problema com as ferramentas, e há problemas com as ferramentas, o Facebook é uma ferramenta horrível para qualquer coisa que não seja o Facebook vender propaganda, é um problema com como a sociedade se organizou no pós-guerra. Mas é mais evidente no Facebook.
Imagine uma TV do futuro onde os programas sejam interseções de cinco minutos em meio a blocos contínuos de anúncios, dez a trinta segundos cada, quarenta e cinco minutos por hora. Isso é o mais próximo que chego de descrever o que é o Facebook hoje. Uma janela que dá para um mundo de sonhos de um detento maníaco do Arkham. Entender as redes sociais corporativas como espetáculo sem sentido é, provavelmente, a melhor definição possível. Não se trata da quantidade de propaganda, mas do fato de todo o conteúdo, mesmo o que não é publicitário, adotar uma linguagem publicitária.
Ganhar o jogo foi simples, questão de falar o idioma dos loucos, oferecer espetáculo em vez de sentido, fazer propaganda em vez de conversar, mas meu lado é o dos produtores de sentido, e sempre será. Há algo de quixotesco em ver tanta verdade no texto de Baudrillard e se insurgir contra essa verdade, mas a luta não vale a pena porque é possível ganhar, mas porque mantém os princípios claros.
Roney Belhassof
@masdivago É uma cadeia fatores que conduz inevitavelmente ao colapso da rede social, que se transforma em uma plataforma comercial social.
As pessoas querem ser vistas por seus contatos e, muitas vezes sem perceber, vão sendo moduladas, moldadas, pelos algoritmos gerando essa massa de comunicação comercial, um tipo de “estado de marketing”, que sequer ao marketing em essência consegue se prestar. É como um tipo de sinal portador que deixa as pessoas na expectativa do próximo produto enquanto, ela mesma, se coloca como produto.