Desde sempre tive uma relação mais semântica que estética com a música. Por isso gostava de muito poucas músicas puramente instrumentais, ou dos solos infinitos. Com os anos foi desenvolvendo o sentido estético e começando a gostar da forma musical, e não apenas dos seus significados e sentidos. Curiosamente esse apreço foi violentamente para o lado do experimentalismo, para quase fora do limite do que é música.

Olhando para a história da música de modo superficial, parece que a apreciação musical é principalmente semântica na maior parte da história ocidental e a estética ganha autonomia bem tarde. Há muito mais debate sobre os poemas cantados nas músicas gregas que sobre sua teoria musical, por exemplo.

Hoje em dia, parece que a estética tem uma certa primazia no mercado fonográfico. A semântica não foi eliminada, mas foi reduzida a uma sensação genérica. Em vez de letras elaboradas, há algumas poucas frases soltas, como uma pintura expressionista, em que as figuras (palavras) ainda estão lá, mas reduzidas a um símbolo, que mais convida a sentir que a entender.

Hoje em dia, a minha música favorita é o casamento da estética experimental com as letras complexas, com textos e subtextos herméticos que convidem à hermenêutica, ao mesmo tempo que sua experimentação estética leve a um estado de deleite e enlevo que só a estética pode fabricar.

Esse equilíbrio delicado entre estética e semântica pode ser encontrado dentro da escrita nas infinitas gradações entre poesia e prosa e escrever é sempre pensar na palavra certa, na construção adequada para tornar o texto mais estético sem comprometer a semântica. Porém, o meu senso estético é o que gosta do que está no limite do aceitável, faz troça dos manuais de redação e quer brincar com os pecados da repetição e dissonância.